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e os seus efeitos terapêuticos, com destaque para a vertente musical

domingo, 23 de janeiro de 2011

Musicoterapia na Perturbação do Espectro do Autismo

Há um corpo literário em crescimento relativamente ao uso da musicoterapia como um tratamento efectivo com pessoas portadores de perturbações da comunicação.
A musicoterapia constitui uma forma “aceitável de expressão de estados interiores, necessidades e sentimentos” (Bruscia, 1998), proporcionando a pessoas com dificuldades na fala a oportunidade de explorar os seus sentimentos e de os exteriorizar sem ter de os verbalizar, isto é, substituindo a necessidade de palavras.
A sua aplicação reveste-se de importância precisamente em situações nas quais a linguagem verbal não se utiliza, isto é, quando não é compreendida, ou é inexistente. A organização do material sonoro correlaciona-se com o processo de combinar letras para formar uma palavra referente a um determinado conceito, uma vez que os sons e ritmos dos instrumentos funcionam como as palavras e frases de uma linguagem não-verbal, facultando um meio de expressão ao indivíduo com Perturbação do Espectro do Autismo (PEA). A criação e organização de sons como ferramenta comunicativa implica, pois, a ordenação de partes que se integram para formar um todo significante.

Por outro lado, a música oferece um meio de comunicação mais facilmente compreendido e assimilado pelos indivíduos com PEA, comparativamente com outros meios mais tradicionais, como a fala, uma vez que oferece espaço, tempo e um meio de comunicação criativo e lúdico. Estudos relativos aos efeitos da música nas competências sociais em crianças com PEA, sugerem que a música lhes providencia o acesso a emoções e estados mentais que facultam a compreensão do outro.
Vários autores apontam as competências sociais adquiridas por indivíduos com PEA como indicadores da eficácia do processo em musicoterapia, nomeadamente a espontaneidade a nível expressivo, o desenvolvimento de capacidades comunicativas e surgimento de iniciativa em situações de interacção social.

A razão pela qual a Musicoterapia se revela eficaz no desenvolvimento de características comunicativas específicas (contacto ocular, atenção conjunta, turn-taking…) em crianças com PEA se relaciona com dois elementos que a caracterizam: as possibilidades de estabilidade (estrutura previsível) e flexibilidade (espontaneidade). A Musicoterapia é, pois, um meio ideal para a expressão destas crianças, que apresentam como característica dificuldades de aceitação e adaptação ao imprevisível na vida quotidiana, pelo facto de se basear em ambientes que a criança pode prever e controlar, verificando-se a concomitância de flexibilidade e criatividade num ambiente de trabalho estruturado.

O homem é uma criatura essencialmente comunicativa, sendo através da comunicação que a vida humana adquire significado. Sob este ponto de vista, e segundo alguns autores (Hamel, 2007; Aguiar & Nisenbaum, 1999; Lelis & Romera, 1997, entre outros) a musicoterapia deve, então, ser valorizada, considerando o contributo que esta pode dar ao indivíduo com distúrbios da comunicação e linguagem.

Faculta a transição do universo singular, privado, que caracteriza a PEA, para um universo pluridimensional, característico de um mundo social. Os recursos musicais, rítmicos e sonoros (sons definidos e indefinidos) vão de encontro à solução para o “isolamento social e (…) solidão em que o autista está aprisionado” (Aguiar & Ninsenbaum, 2000).

Bibliografia:
· Magee, W. L.; Brumfitt, S. M.; Freeman, M.; Davidson, J. W. (2006): The role of music therapy in an interdisciplinary approach to address functional communication in complex neuro-communication disorders: a case report. Disability and Rehabilitation, 28(19), 1221-1229
· Aguiar, R.; Ninsenbaum, E. (1999). Musicoterapia: superando fronteras. Rio de Janeiro: CC&P Editores
· Kim, J.; Wigram, T.; Gold, C. (2008): The effects of improvisational music therapy on joint attention behaviors in autistic children: a randomized controlled study. Journal of Autism and Development Disorders, vol. 38, 1758-1766
· Sousa, T. P. (2007). A musicoterapia como auxílio na comunicação de pessoas com deficiência mental. Goiânia: Escola de Música e Artes Cénicas da Universidade Federal de Goiás.
· Gomes, A. M.; Simões, A. (2007): A Música e a Criança com Distúrbios de Comunicação e Linguagem. Cadernos de Estudo. Porto: ESE de Paula Frassinetti. nº5, p.127-141
· Lelis, C.; Romera, M. L. (1997). Musicoterapia nas oficinas terapêuticas: trilhando e recriando horizontes. Revista Brasileira de Musicoterapia, nº3, p.41-49
· Hamel, N. (2007). Musicoterapia: a escuta terapêutica da linguagem musical. Revista Brasileira de Musicoterapia. Nº8, p.66-77

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